Supermercado JIRÉ

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quarta-feira, 18 de março de 2015

LEI MARIA DA PENHA

A Lei Maria da Penha é muito mais do que a parte criminal’, diz promotora do Gedem No mês de março, o Bahia Notícias enfoca em uma série de entrevistas com algumas das diversas faces femininas do Judiciário baiano. A entrevistada da vez é a Márcia Teixeira, coordenadora do Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher (Gedem), órgão ligado ao Ministério Público da Bahia, além de também ser promotora de Justiça titular  da 12ª Promotoria de Justiça da Cidadania do Ministério Público da Bahia. Márcia comenta sobre os avanços e dificuldades que as políticas de proteção para a mulher têm tido na Bahia e no Brasil desde a implantação da lei Maria da Penha, em 2006. “A discussão dá um salto com a lei Maria da Penha. Ela é muito mais que a parte criminal, é uma proposta de reflexão de todas as políticas em relação a mulher”. Leia abaixo a entrevista completa.A senhora assumiu a coordenadoria do Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher aqui na Bahia bem no início da criação da Lei Maria da Penha. Como foi esse processo de implantação até os dias atuais?

A lei entrou em vigor em setembro de 2006. Em dezembro, o procurador-geral à época, que era Lidivaldo Britto, recebeu  representações de mulheres e dos movimentos sociais. Eles fizeram essa visita a defensoria, ao tribunal de justiça e o ministério público, e eles se comprometeram a criar uma promotoria, um núcleo para dar conta dessa demanda. Internamente, nós discutimos e em dezembro surge um grupo especial de defesa das mulheres. Nós começamos a trabalhar efetivamente nessa temática em 2007. Essa preocupação com a questão da violência contra a mulheres vem sendo construída. A legislação entra em vigor por uma necessidade da nossa sociedade, mas a gente continua sempre trabalhando para sua ampliação, porque a sociedade é dinâmica. E a legislação tem que acompanhar, seja com a jurisprudência ou com as interpretações. Isso a gente vem fazendo ao longo desses anos. Nesse primeiro momento, o Gedem é um núcleo diferenciado no Brasil, porque nós não trabalhamos só com a violência doméstica e parte criminal, mas também com todas as demais demandas que são apresentadas a partir da Lei Maria da Penha. A questão dos direitos coletivos, das políticas públicas. O Gedem vem se preparando para essas demandas que vão surgindo. Em 2014, houve uma alteração na nossa legislação para incluir na resolução ltambém a população LGBT por conta dessa necessidade de mais um grupo da sociedade que necessita de orientação nessas questões das políticas públicas. Junto com os movimentos sociais, que são os principais sinalizadores das necessidades de políticas públicas, o ministério público faz essa aproximação, tentando aproximá-los do poder político. O Gedem é um grupo que tem essa dinâmica e pelas respostas que temos tido, pela quantidade de estudantes que vem nos entrevistar, pelos trabalhos das professoras das universidades que têm sido feitos nos citando como uma boa prática, vários ministérios públicos têm seguido uma mesma dinâmica, com as suas inovações específicas. Isso tem sido muito bom, a Copevid (Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher) é um espaço de compartilhamento de experiências, boas práticas, e isso nos fortalece nacionalmente.
Quais são os principais problemas que as mulheres ainda enfrentam para poder denunciar? 
As principais dificuldades são atomizações das instituições, por eles não estarem juntos no mesmo lugar fisicamente, a dificuldade de como funcionar essa rede tanto dos órgãos da saúde e de ação social que também funcionam atomizados e o sistema de justiça, a falta desse apoio.
 
Há situações em que as mulheres que sofrem essas violências correm risco de vida, especialmente por ex-parceiros que não aceitam o fim do relacionamento. Elas pedem proteção judicial, que muitas vezes não vem, e elas acabam morrendo. Quais as causas desta omissão por parte do estado e do poder judiciário?
O que acontece é o seguinte: A Bahia tinha só duas varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, uma em Salvador e outra em Feira de Santana. Teremos agora mais duas, uma em Vitória da Conquista e outra em Salvador. Imagine que uma cidade de três milhões de habitantes, com 52% de mulheres, e que, de acordo com as pesquisas, uma em cada três mulheres já sofreu algum tipo de violência, uma vara especializada é muito pouco. A gente tem na lei Maria da Penha a medida protetiva. Na hora que a mulher diz que está em uma situação grave e precisa da medida protetiva e a lei diz tem 48 horas para que seja cumprida. Muitas dessas medidas protetivas eles são deferidas e são cumpridas, mas dezenas de milhares não são. Nós temos sorte. Se formos analisar apenas por números, o número de baixas, é até pequeno. Sem olhar vidas e sim números. Mas a gente deve até ter mais casos no interior que não sabemos. No Distrito Federal, nós temos 19 varas de violência doméstica e 42 promotores. Em Salvador, atualmente nós temos duas promotoras na vara. O que é isso? Por isso que nós somos o segundo estado mais violento contra as mulheres no Brasil.
 
Segundo dados divulgados pelo Ipea, entre 2001 e 2011, mais de 60% das mulheres que foram assassinadas no Brasil eram negras. A maioria delas, de classe baixa. Então pergunto para a senhora: a morte de mulheres no Brasil tem cor e classe social?
Sem sombra de dúvida. Ser mulher é um fator de vulnerabilidade. Ser negra também. Se for pobre, deficiente ou lésbica também. Quanto mais especificidades você vai incluindo, a pessoa vai levando esse rótulo de vulnerabilidade muito maior. Fora a questão da baixa escolaridade. Porque ela não sabe que medidas tomar, não tem muita opção de trabalho. Essas mulheres estão muito mais vulneráveis do que mulheres de classes sociais elevadas. 
 
Outro estudo do Ipea mostra que entre 2009 e 2011 estima que ocorreram mais de 16 mil feminicídios no Brasil. E a Bahia é o segundo estado com maior índice de assassinatos. Além da região Nordeste ser considerada a de maior índice em relação as outras regiões brasileiras. Quais seriam as causas que levam a baiana a ter um índice tão alto?
Acho que tem a questão vulnerabilidade econômica e também a violência urbana, já que nosso estado infelizmente não está como exemplo em segurança pública. Mas, como eu disse no início, a gente não sabe se essas mortes de mulheres se deram por acidente de trânsito, latrocínio, motivada por bala perdida, por uma briga no bar. A maioria dessas informações não nos dá certa da forma que aconteceu aquela morte violenta. Mas isso nos mostra, assim como no Espírito Santo que está em primeiro lugar, que a violência urbana tem um impacto muito grande, não só a violência de gênero, nessas mortes violentas de mulheres. O grande problema que nós temos é a falta de investimento em ações sociais, na educação e a questão da segurança pública. Não temos opções de lazer para envolver os jovens. Eu assisti uma apresentação de uma pesquisa da professora Mary Castro, da Universidade Católica, na qual em uma pesquisa sobre jovens uma resposta me chocou muito. O que você espera da vida? Muitos responderam ficar vivo. Ficar vivo para uma menina pobre, negra, de determinadas localidades, já é muito precioso. E a gente não se conta do que isso significa. Essas meninas estão pedindo para viver e não tinha perspectiva de futuro. Isso é muito triste.
 
Para terminar, qual é o balanço que a senhora faz desses nove anos da lei Maria da Penha?
Acho que com a lei, muitos temas relacionados a mulher passam a ter visibilidade. Muitas instituições passam a refletir sobre a questão de gênero. Muitos órgãos começam a se preocupar com a mulher nesse contexto. Essa violência ela salta abruptamente de dentro de casa para fora. Começa a se pensar que existem homens e mulheres. Então nós estamos tendo um ganho extraordinário para a sociedade. Se a gente acompanhar a ampliação de serviços, o número de pensadores, professores e juristas que está pensando sobre isso, que leva para o cotidiano esses questionamentos sobre gênero. Isso vai trazendo uma reflexão sobre criação, orientação sexual, as violências praticadas contra as crianças, temos que incluir nisso as violências praticadas contra as meninas, barbaridades que acontecem dentro das casas e que a sociedade faz de conta que não está vendo. Basta uma conversa com médico que trabalhe em emergência para ver quantidade de bebes que são estuprados. Essa discussão dá um salto com a lei Maria da Penha. Ela é muito mais que a parte criminal, ela é uma proposta de reflexão de  todas as políticas em relação a mulher. Temos muito a aprender e evoluir com ela, mas tivemos grandes avanços e impactos positivos. Se a gente imaginar o planejamento estratégico do ministério público. A equipe em 2007 éramos eu e uma estagiária em 2007. Hoje somos muitos promotores no projeto de enfrentamento A gente tem uma casa com psicólogo, advogada, assistente social. Temos carro para levar as mulheres. Claro, temos fragilidades. Antes eu estava sozinha, numa sala de seis metros quadrados, agora estou numa casa com uma equipe fantástica, bem preparada. Numa casa de quase 400 metros quadrados. Isso não é só aqui na Bahia. É no Brasil inteiro que temos colegas dedicados na causa.

FONTE: Bahia Notícias

VEJA BAIXA GRANDE, MARCELO BARBOSA JP

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